A viagem começa de carro, o destino encontra-se a 60km para sul de Sarajevo. Segue-se por uma estrada de montanha… Uma hora depois chega-se a Konjic (Konhits).

Carro estacionado na sombra, porque o acesso a bunker tem que ser organizado, controlado, as pessoas contadas… Sem perceber porquê esse mistério todo, pacientemente espero pelo autocarro oficial.

No dia anterior tive que ligar para o bunker, dar o meu nome, dizer a que horas chego… o autocarro finalmente chega ao terminal da pequena vila de Konjic. Noto logo que o veiculo já perdeu o direito de se chamar “autocarro”, com alguns milhões de quilómetros no bolso e o estado de degradação (para não dizer “de separação de peças”) invejável.

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A vivenda que disfarçava a entrada para o bunker

Pago os 10KM (5 euros) e entrego-me a duas raparigas-guias simpáticas. Junto-me ao grupo de mais de uma dúzia de pessoas, e assim partimos, sem saber em que direcção e quanto tempo a viagem iria durar. Continuo sem compreender o mistério, mas pronto…

Uns vinte minutos mais tarde chegamos ao destino. Durante a viagem tive o cuidado de decorar o caminho. Passei por aí, perto, tantas vezes sem ter mínima ideia que um monstro desses se encontrava no coração de montanha de Prenj (Prenhe).

O autocarro detém-se frente a um portão e aparece um soldado bósnio armado de uma M16 e com o capacete pendurado a cintura. Depois de uma curta conversa entre o militar e o nosso motorista, segue-se o primeiro aviso que explica o mistério todo:

“- Por favor, a partir deste ponto, baixem as vossas máquinas fotográficas. Estamos a entrar no recinto de um quartel militar. Posteriormente vão ser avisados quando chegarmos a zona onde se pode fotografar. Por favor, tenham o cuidado de cumprir esta regra para não corrermos o risco de sermos expulsos sem ver o Bunker…

Muito bem, pouso a minha máquina no colo e começo observar o interior de quartel… Alguns metros a frente, o autocarro para em frente de uma vivenda. E é isto… a entrada do bunker… Uma vivenda.

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Central de comunicações telefónicas

Parece simples. Uma porta de entrada, um portão de garagem… Mas passando pelo interior da vivenda, começa o mundo descrito nas minhas fotografias. As imagens foram recolhidas um pouco à pressa, durante 45 minutos que consegui ficar no interior.

Depois da entrada, percebi que estava num grupo que tinha um guia… aquele turismo clássico que detesto. Mal passámos o Check-Point onde foi confirmado o número de pessoas, na minha cabeça começa a germinar um plano… “Vou fugir do grupo, vou me esconder no interior do bunker e depois começar a explorar sozinho… Medo não tenho, mas será que vou conseguir?

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A sala dos Telexes

O grupo entra, tipo um rebanho de ovelhas atrás do pastor. Na retaguarda do grupo, a ovelha negra – eu. Logo na entrada da parte principal, escondo-me atrás da pesada porta de ferro e fico a espera para ver se alguém nota a minha ausência… As vozes desaparecem e percebo que estou sozinho… Muito bem… Começo a explorar, sala a sala, algumas zonas escuras… Vou ligando as luzes sempre que consigo encontrar o interruptor, mas a minha missão tem uma meta bem definida: encontrar o gabinete e os aposentos de Marechal Tito.

Sim, o bunker foi construido para alojar o Marechal Tito e a sua família, a nata do Partido Comunista, o Governo e o Estado Maior… Toda essa gente com respectivas famílias. No total, 350 pessoas. A ideia era proteger esses 350 eleitos de um ataque nuclear, num bunker muito especial.

A construção do complexo iniciou-se em 1953 e terminou em 1979. Tem um espaço invejável, de mais de 6000m2. Foi construido para aguentar um bombardeamento nuclear e respectiva radiação, e fornecer tudo que é necessário para se sobreviver no seu interior durante cerca de seis meses.

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O aparelho do telefonista, com o livro de conduta e os códigos.

Fazendo contas com alteração de valores monetários, falando em trocos de hoje, custou uns colossais 19,5 mil milhões de euros… pouca coisa.

A minha exploração começa dar resultado. Encontro umas escadas. A planta na entrada não falava em pisos superiores e não me parecia ser um acesso aberto aos visitantes. Encontro um interruptor e luz nas escadas acende… Excelente… Subo e rapidamente percebo que estou na zona exclusiva prevista para o Marechal… Encontro o gabinete dele, com mesa, cadeira, telefone vermelho… Segue-se a zona dos guarda costas, o quarto, mais alguns gabinetes… Rapidamente percebo que estou numa zona exclusiva e tento apressar a minha exploração do piso. Encontro as notas, dinheiro de antiga Jugoslávia… só mais uma foto…Começo ouvir vozes no piso inferior. Se forem visitantes, tudo bem, mas se forem guardas vão notar a luz acesa nas escadas.

Fico quieto a espera de ver o que acontece, mesmo junto ao quarto do Tito, quando a minha visão periférica capta a imagem de uma porta aberta, com o interior escuro mas com algum brilho junto a porta. Parecia uma sanita. Vou, não vou, vou, não vou…? Vou, claro que vou… É a casa de banho privada de um dos maiores ditadores do século XX e eu estou mesmo com vontade de… Mas vai ter que ser rápido e sem fazer muito barulho… Aliviei a a bexiga tentando acertar nas paredes da sanita para evitar fazer ruído, embora as vozes no piso inferior já se tenham desvanecido.

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A sala de conferências, com o incontornável telefone vermelho

Acabei e fiquei a escutar… Nada… Silêncio… OK, vou ser bem educado e puxar o autoclismo… Puxo o fio e só ouço CLONQUE… Nada, o autoclismo vazio. Epá, desculpe-me o meu Marechal, mas vou ter que deixar o meu cheirinho na sua casa de banho…

Comecei-me rir descontroladamente enquanto descia as escadas a procura de uma saída lateral que notei na planta e memorizei bem. Encontro a saída e já bem nas escuras viro-me e tiro mais uma foto: Missão Cumprida!!

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O Vedo é bósnio, nascido e crescido em Sarajevo, mas vive em Portugal há cerca de vinte anos. Estabeleceu-se no Algarve, onde conheceu o Ricardo - criador do Visitar a Bósnia e Herzegovina - sendo um consultor oficioso sempre disponível.

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